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Treinamento core? Isolado? Integrado? Apenas levantar peso? Draw-in? Brace?

Por Michael Boyle

Tradução livre: Bárbara Silva e Sidiclei Souza



O Dr. Stuart McGill descreve a estrutura do core como "uma vara de pescar sustentada por fios-guia". Em outras palavras, a coluna é uma estrutura flexível tornada mais rígida ou mais estável por influências externas. McGill também descreveu os músculos abdominais profundos como algo que obtem sua força de camadas cruzadas, muito parecido com aquela madeira que chamamos de "compensado". Ambas as analogias podem ajudar a delinear uma imagem do treinamento do core.


O trabalho do Dr McGill é tanto interessante quanto envolvente, e seus livros Mecânico da Lombar e Low Back Disorders, são leituras obrigatórias para qualquer profissional de força e condicionamento.

Outra analogia complementar à vara de pescar é ver os músculos do core funcionando como as linhas ou cordame de um veleiro. Pense na coluna como um mastro, praticamente inútil sem velas e sem cordames. Adicione o aparelhamento e as velas (abdominais, oblíquos e musculatura próxima) e a vela pode ser controlada para realizar movimento e trabalhar em velocidade. As linhas controlam o movimento da vela para aproveitar o poder do vento. A vela é inútil sem o mastro e o mastro é inútil sem a vela.


Os músculos do core permitem a transferência de energia da parte inferior do corpo para a parte superior do corpo através do seu sistema de aparelhamento. Pense nesse aparelhamento como anti-rotacionais e estabilizadores para a vela e o mastro, ou como as linhas que sustentam a vara de pesca.


Nosso conhecimento cada vez maior da anatomia funcional mostrou que os abdominais realmente não puxam a caixa torácica em direção à pelve como em uma abdominal convencional, e que a função de todos os músculos abdominais pode ser melhor vista como a de prevenir ou controlar o movimento, em vez de causar movimento.


De volta à ideia de aparelhamento da vela: os músculos anteriores do core se conectam e posicionam a pelve e a caixa torácica para aproveitar e transferir energia a partir das pernas. Sem controle muscular, a coluna desenvolve "vazamentos de energia". O vento sem velas ou cordame é apenas vento.


Nossa maior compreensão da anatomia funcional também trouxe palavras como "anti-extensão", "anti-rotação" e "anti-flexão lateral" para nosso léxico de treinamento. Essa maior compreensão se deveu em grande parte ao trabalho de pessoas como Shirley Sahrmann, James Porterfield e Carl DeRosa, bem como do já mencionado Dr. McGill.


Sahrmann afirma:

“Durante a maioria das atividades diárias, o principal papel dos músculos abdominais é fornecer suporte isométrico e limitar o grau de rotação do tronco... Uma grande porcentagem de problemas lombares ocorre porque os músculos abdominais não estão mantendo um controle rígido sobre a rotação entre a pelve e a coluna no nível L5–S1.” (Diagnóstico e Tratamento de Síndromes de Deficiência de Movimento, 2001, p71).


Em outras palavras, os abdominais geralmente fazem um trabalho ruim de controlar a rotação - ouseja, de anti-rotação. Eles são péssimos em aparelhamento.

 

Infelizmente, muitos defensores do powerlifting ou do levantamento olímpico sentem que a maioria dos avanços científicos feitos nas áreas de medicina esportiva e fisioterapia não se aplicam aos esportes de força. Tal como acontece com muitos pontos defendidos por aqueles que consistentemente levantam pesos com os dois pés no chão, nisso discordamos. Acredito que nossas influências na área de treinamento docore devem ser os pesquisadores, médicos e fisioterapeutas que lidam com atletas lesionados, não as pessoas de esportes como o powerlifting ou levantamento olímpico, que estão enviando seus atletas lesionados para esses médicos e terapeutas influentes.


Parece fácil para aqueles treinadores olímpicos de LPO e de powerlifting que nunca precisam se preocupar com atletas correndo ou pulando, nos dizer como treinar aqueles que o fazem.


Infelizmente, quando os treinadores de powerlifting ou levantamento olímpico começam a passar do desenvolvimento de força e potência para o mundo da melhoria de desempenho, surgem problemas. Mas a ciência não pode ser negada... pelo menos não por muito tempo.


A ciência nos diz que os músculos abdominais profundos (oblíquo interno, oblíquo externo, transverso abdominal e multífido) desempenham um papel fundamental na estabilidade da coluna lombar. Muitos na comunidade do treino de força parecem discordar. Embora a discordância seja saudável, já vi muitos atletas de força com problemas nos quadris e na região lombar para acreditar que exercícios como agachamento e deadlift fornecem treinamento suficiente para a estabilidade do core. Se isso fosse verdade, nenhum levantador convencional sentiria dor nas costas.

  

“Atletas e clientes devem aprender a se mover a partir dos quadris, não da coluna lombar.”

“Acredito que a maioria dos atletas com dor lombar ou distensões nos isquiotibiais tem uma mecânica ruim do quadril e/ou lombopélvica e, como resultado, deve estender ou flexionar a coluna lombar para compensar o movimento que o quadril não consegue realizar.”

 

Aprender a estabilizar a coluna e mover os quadris - mobilidade do quadril na presença de estabilidade lombar - é provavelmente o segredo para ser capaz de treinar força enquanto permanece saudável. Trinta anos atrás, eu não entendia ou apreciava a anatomia funcional da musculatura abdominal profunda ou a anatomia funcional do quadril. Embora agora eu seja bem versado, continuo estudando e aprendendo sobre essas áreas críticas.


Mais recentemente, pessoas como Ron Hruska e o Postural Restoration Institute ® (PRI) adicionaram outra camada de conhecimento à nossa compreensão, em constante evolução, do core.


Durante anos, contemplamos como estabilizar a coluna vertebral. O Dr. McGill e Paul Hodges propuseram diferentes estratégias de estabilidade. No início dos anos 2000, escrevi extensivamente sobre os métodos australianos de treinamento dos músculos abdominais profundos. As pesquisas de Richardson, Hodges e Jull, através de seu trabalho de referência Exercício Terapêutico para Estabilização do Segmento Espinhal na Dor Lombar, avançou significativamente nosso conhecimento da anatomia do core e da função muscular. Esse livro e a pesquisa que o precedeu mudaram a maneira como o treinamento do core era percebido e realizado. Anos mais tarde, após o livro Low Back Disorders, de McGill, treinadores e terapeutas debateram o uso do "bracing" em vez do "drawing", à medida que procurávamos entender como acessar e utilizar o que eram efetivamente esses “novos músculos” para muitos de nós.


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Terminologia:

Drawing in - a ação de trazer o reto abdominal em direção à coluna vertebral. Teoricamente, isso é feito contraindo os músculos transverso do abdome, oblíquo externo e oblíquo interno.


Hollowing - outra descrição do "drawing-in", que assume que a ação resulta em uma diminuição do diâmetro da cintura. No "hollowing", o objetivo é ficar o mais fino possível.


Bracing - a técnica ensinada e favorecida por McGill que envolve uma coativação simultânea do abdome transverso, oblíquo interno, oblíquo externo e reto abdominal. No "bracing", não há tentativa de diminuir o diâmetro na cintura, apenas para coativar os músculos.

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Na área do treino de força e condicionamento, essas divergências se resumiam principalmente à semântica. A pesquisa australiana/Hodges na área do drawing ainda pode ser aplicável aos atletas, mas se é um draw-in ou um brace pode ser um pouco menos relevante do que se pensava inicialmente.


Embora eu claramente não esteja qualificado para contestar a pesquisa do Dr. McGill, tenho um pequeno ponto de desacordo teórico. A pesquisa do McGill mostra claramente que fazer o drawing ou hollowing, pode diminuir a base de suporte e estabilidade da coluna vertebral. No entanto, se estamos ensinando uma ação de drawing como um exercício de consciência neuromuscular, mas não como o principal veículo para a estabilidade, isso representa um problema? O próprio McGill afirma: "O hollowing pode atuar como um exercício de reeducação motora".


Curiosamente, o pessoal do PRI usa o que chamamos anteriormente de "draw-in quadrúpede". Eles agora chamam isso de "all-four belly lift". É uma espécie de De Volta para o Futuro.


Respiração e Treinamento do Core

Na respirar é onde realmente erramos no treinamento do core.


No passado, não consegui entender que a respiração intencional - o que poderíamos chamar de "respiração profunda" ou "respiração diafragmática"- tem um componente muscular significativo. Na verdade, embora a respiração seja reflexiva, nem todos os atletas respiram corretamente ou utilizam totalmente os músculos corretos. Nosso programa de treinamento do core agora começa com a respiração, e a respiração intencional é incorporada em quase todos os exercícios para o core.


Sabemos agora, principalmente ao estudar o PRI, que os músculos abdominais profundos críticos necessários como estabilizadores também são músculos respiratórios. À medida que estudamos a respiração, vemos o abdome transverso, o oblíquo interno e o oblíquo externo classificados no mundo da respiração como músculos de "exalação em estágio final". Em outras palavras, a expiração agressiva é facilitada pelos músculos abdominais profundos. Os músculos abdominais profundos funcionam como assistentes à medida que o ar é forçado a sair.


Pesquise no Google "o valor de encher uma bexiga".  Você não precisa encher bexigas; você só precisa entender o envolvimento da expiração em estágio final dos músculos abdominais profundos.


No treinamento do core, podemos usar isso em nosso benefício, usando a expiração forçada como um método para ajudar a recrutar os abdominais profundos. Em vez de dizer aos atletas para fazer o drawing ou o brace - o que agora consideraríamos uma dica “artificial” -, sugerimos que eles executem uma expiração máxima. Essa expiração naturalmente recrutará os estabilizadores que tentamos “ligar” no treinamento do core. A diferença em como fazer exercícios do core agora se resume à respiração. O conceito do exercício permanece o mesmo, mas a contração isométrica dos abdominais profundos que tentávamos conseguir com dicas verbais agora é obtida por uma expiração intensa.


Isso nos leva à ideia do autor David Epstein de "conexões negligenciadas" e "conhecimento público não descoberto". Em seu livro Range (p180), Epstein descreve como muitas vezes há informações prontamente disponíveis de uma disciplina aparentemente não relacionada.


Em nenhum lugar isso é mais evidente do que no estudo da respiração. Durante décadas, a revisão da respiração foi deixada para terapeutas respiratórios e professores de ioga e foi completamente negligenciada e, em muitos casos, rejeitada pela comunidade do treinamento de força e potência. No passado, quando perguntado sobre respiração e trabalho respiratório, muitas vezes eu respondia brincando: "Todos os meus clientes estão respirando atualmente". Na época, eu achava que era engraçado, mas agora percebo que era muito burro.


Essa relação da respiração e da musculatura do core explica o conceito do Kiai do judô, que é usar um grito para ajudar a amortecer uma queda, e provavelmente também explica os muitos grunhidos que ouvimos na quadra de tênis. Ponto principal: Uma expiração profunda ajuda na estabilização do core e no recrutamento dos músculos abdominais profundos.


De repente, a respiração se torna uma peça crítica do quebra-cabeça da estabilidade do core. No passado, a maioria dos treinadores não se importava com a respiração de seus atletas, apenas se importava que eles estivessem respirando. Podemos ter discutido sobre inspirar versus expirar ou sobre prender a respiração, mas nunca sobre a ação em si.


O primeiro segredo para entender a respiração é reconhecer que o diafragma é um músculo e, embora funcione involuntariamente, também pode ser engajado conscientemente. Na respiração "boa", o diafragma funciona durante a inalação e os músculos abdominais profundos trabalham durante a expiração. Na inalação, há uma contração concêntrica do diafragma.


Na realidade, o diafragma é uma cúpula que se achata na contração concêntrica e empurra para baixo o conteúdo abdominal. É por isso que a respiração profunda é muitas vezes referida como "respiração pela barriga". Gosto de usar a analogia das crianças no acampamento brincando com um pára-quedas, puxando o pára-quedas para baixo para criar uma imagem visual.


Também entendemos agora que uma respiração deve entrar pelo nariz que facilita a descida do diafragma, e uma expiração atlética deve ser intensa e através de lábios franzidos, como ao soprar uma vela.


O diafragma é um músculo! Lembro-me da minha amiga Sue Falsone palestrando na Mike Boyle Strength and Conditioning quando disse que o diafragma era seu músculo favorito. Fique sentado pensando: "O diafragma é um músculo?" Então me lembro de pensar: "Como treinamos um músculo que não podemos ver ou tocar?".


Aqui nos sentamos pensando em inalar para facilitar um músculo - sim, o diafragma é o yin, em relação aos músculos abdominais profundos, que são o yang, e em seguida, exalar para facilitar os outros.


De repente, a ideia do treinamento de estabilidade do core faz mais sentido. A pesquisa (Hodges, McGill, etc.) estava apontando para facilitar os abdominais profundos para criar a estabilidade que buscávamos. No entanto, em vez de dizer "brace", "drawing", "puxe o umbigo", tudo o que precisamos dizer é "expire com força" e "expire por muito tempo". Este foi um grande momento de epifania.


Inspire pelo nariz, movendo o ar para dentro da caixa torácica. Não queremos elevar os ombros ao inspirar porque um encolher de ombros significa que os atletas estão usando músculos acessórios de inspiração - pense nos escalenos, no levantador da escápula, no ECM.


Os atletas devem expirar pela boca como se estivessem soprando velas. Digo aos meus atletas para expirarem como se estivessem na minha festa de aniversário e precisassem soprar mais de 60 velas.


Sopre com força e por muito tempo. Para facilitar isso, a maior parte do nosso treinamento do core usa contrações isométricas concêntricas de cinco segundos.


Então... O que é o Treinamento do core?

As áreas de aquecimento, ativação muscular, treinamento do core e de mobilidade tornam-se irremediavelmente entrelaçadas.


Sahrmann se refere à ideia de "o músculo certo movendo a articulação certa no momento certo". Uma descrição melhor no mundo da estabilidade do core pode ser "os músculos certos estabilizando a articulação (ou articulações) certa no momento certo". Em ambos os casos, esta é uma das declarações mais simplisticamente brilhantes já escritas e é central para o nosso conceito de aquecimento, mobilidade e treinamento do core. Queremos os músculos certos movendo as articulações certas no momento certo; os músculos certos estabilizando as articulações certas para ajudar a fazer isso acontecer.


Isso significa que partes do aquecimento podem ser exercícios básicos de mobilidade que incluem um componente de treinamento do core. Exercícios como pontes em duas pernas, pontes unilaterais, leg lowers e floor slides têm um foco combinado na mobilidade, na ativação muscular e no controle do core. O objetivo de fazer com que “o músculo certo mova a articulação certa no momento certo” é realmente o objetivo do aquecimento para nós.


Os glúteos devem estender os quadris enquanto a musculatura do core controla ou limita a extensão lombar. Isso também significa que os flexores do quadril devem controlar o leg lower, enquanto os músculos do core impedem a extensão lombar. O segredo para o treinamento do core é a percepção de que estamos trabalhando em vários componentes. Gray Cook talvez se refira a isso como desenvolver "controle motor".


Com o treinamento do core, podemos talvez nem estejamos nos fortalecendo, mas sim reeducando o sistema neuromuscular. Para fazer isso, o atleta precisa da capacidade de controlar isometricamente o core enquanto usa concentricamente e excentricamente os glúteos e os flexores do quadril.


Quando você pensa em treinamento de core, podemos pensar de forma tão simples quanto na execução de pranchas e pranchas laterais, e tão complexa quanto a execução de um agachamento unilateral. A maioria dos bons exercícios terá um componente relacionado ao core, mas um programa básico para o treino do core, provavelmente, consiste em uma base contendo prancha frontal, prancha lateral e pontes e progride para exercícios como chops e lifts. O segredo para começar a entender o treinamento do core é entender a complexidade da anatomia dessa região. Posições unilaterais exigem estabilidade em todos os três planos e o treinamento do core progride com isso em mente.


Se você acha que ficar em pé sobre duas pernas com uma carga pesada nas costas ou nas mãos é todo o treinamento do core de que precisa, talvez seja hora de pesquisar um texto de anatomia e reexaminar o que você acha que sabe.


Lembre-se, é o que você aprende depois de saber tudo o que conta.

 

 

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